O Globo Barra, Fabíola Gerbase e Flávia Milhorance, 20/mai
Principal canteiro de obras da cidade, a Baixada de Jacarepaguá concentra um número de lançamentos imobiliários que já não condiz com a oferta de trabalhadores no mercado. A preocupação das empresas de construção civil com a dificuldade de achar operários se agrava com a proximidade dos Jogos Olímpicos, que, além de valorizar ainda mais a região, implicarão na construção de várias estruturas esportivas e viárias. Em busca de respostas, as construtoras Carvalho Hosken, RJZ Cyrela e Dominus realizaram uma pesquisa com 385 de seus empregados para traçar um perfil sociodemográfico do grupo. A constatação de que 75% deles vivem fora da região traz a essas empresas a certeza de que, para atrair novos trabalhadores de forma estruturada, é preciso agilizar as melhorias em transporte e pensar em soluções de habitação popular.
Dados da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) mostram que 55% das dez mil unidades residenciais lançadas no Rio entre 2004 e 2008 estão na Baixada de Jacarepaguá. A relação entre a expansão do mercado imobiliário e o inchaço das favelas da região ainda é clara. Entre os 106 operários ouvidos na pesquisa que vivem nas redondezas, cerca de 38% são da comunidade de Rio das Pedras.
- Vim há quatro anos morar no Rio e comecei direto em canteiro de obras. Vivendo em Rio das Pedras, só gasto meia hora para chegar ao trabalho - explica o nordestino João Batista de Lima, de 29 anos, acrescentando que seus primos, moradores da comunidade, também trabalham como operários.
A pesquisa mostrou ainda que a migração de nordestinos para trabalhar em construções no Rio continua sendo uma realidade. Cerca de 58% dos entrevistados pelas empresas nasceram na região, a maior parte, na Paraíba. Há pouco mais de um mês, veio de lá o ajudante de obras Pedro Justino, também direto para Rio das Pedras.
A questão do deslocamento para o trabalho, levantada por João Batista, foi detalhada nas entrevistas para saber quantas conduções cada operário precisa pegar e quanto tempo perde no trânsito. Mais da metade deles leva de uma a duas horas no trajeto de casa para o trabalho.
Essa era a realidade do encarregado de obras Luiz Vieira dos Santos quando morava em Nova Iguaçu, de onde saiu há cinco anos para viver em Curicica:
- A condução da Baixada para cá é muito cara, e demora muito para chegar. Os empregadores preferem quem mora mais perto. Eu gastava mais de R$12 por dia.
A dificuldade de contratar mão de obra passa também pelo problema de achar operários qualificados. A pesquisa mostra que apenas 16,19% dos trabalhadores entrevistados fizeram alguma espécie de curso técnico. Os demais aprenderam o ofício observando outros operários. Empregado atualmente em um canteiro de obras na Península, Alex Gutenberg conta que começou ajudando o padrasto em alguns serviços:
- Fui aprendendo e fazendo. Nunca fiz cursos.
Nesse cenário, o operador de máquina Sérgio Barbosa é uma exceção. Ele já fez vários cursos para aprender a manejar novos equipamentos.
Mais moradias e transportes
Mais moradias e transportes
A escassez de operários nos canteiros de obras tem levado as construtoras a se precaverem como podem.
- Antecipamos cada vez mais o planejamento. Chegamos a contratar um serviço três meses antes do início da sua prestação - diz Wagner Lofare, diretor de operações da João Fortes Engenharia.
A empresa está construindo três empreendimentos na Barra e no Recreio. E, segundo Lofare, nos últimos dois anos houve aumento de cerca de 7% nos salários, devido à grande demanda e à pouca oferta.
A falta de funcionários abrange todos os níveis, dizem os empreiteiros.
- Faltam desde gesseiros a engenheiros civis, passando por carpinteiros, serventes e técnicos de edificações. Está difícil contratar - afirma Bruno Oliveira, gestor de marketing da construtora Calçada.
As construtoras buscam a maior parte da mão de obra nas empresas especializadas em fornecê-la, mas também costumam manter suas próprias equipes de operários. Considerando esses grupos, a tendência vem sendo investir em treinamento, para capacitar funcionários e aproveitá-los em funções que têm poucos profissionais disponíveis. Foi assim que Leandro Paiva, ex-servente da Carvalho Hosken, tornou-se guincheiro (opera uma máquina que ergue material até o alto dos prédios em construção).
- Entrei há três anos como servente. Fiz dois cursos: o primeiro para trabalhar como sinaleiro de grua, e o segundo, como guincheiro - relata.
Engenheiro da construtora, Marcio de Moraes explica que, após o curso para sinaleiro de grua (auxiliar do operador da grua), foram aproveitados na função aqueles que se destacaram durante o treinamento.
- Como depois não achamos guincheiros no mercado, treinamos o Leandro novamente - explica Moraes.
Atuante no mercado de casas de luxo, a construtora Leduca quer erguer edifícios. Por isso, Paulo Marques, seu sócio-diretor, planeja uma parceria com Firjan, Sesc e Senai para capacitar seus operários no próprio canteiro de obras:
- Se eu for pagar o alto valor da mão de obra que está disponível, terei de repassar o custo para o preço do imóvel, que não será competitivo. A solução é fazer em casa.
O diretor de marketing da Rubi Engenharia, Luiz Otávio Queiroz, lembra que os investimentos em transportes não têm crescido na mesma proporção que a demanda por trabalhadores na região.
- Devido às más condições de acesso, ou os operários moram perto ou, muitas vezes, são obrigados a dormir até na própria obra - conta.
Vindo de Capela Nova (MG), o pedreiro Aguiar Duarte, de 58 anos, habituou-se a dormir nos canteiros:
- Não tenho condições de pagar aluguel. Então, quando termina uma obra, vou para outra, como vigia.
Com quatro empreendimentos em construção na Barra, a Brookfield Incorporações também tem dificuldades para contratar pessoal, explica Luiz Fernando Moura, diretor da companhia no Rio:
- Temos uma preocupação muito grande e, como todo o mercado, aguardamos investimentos em transporte de massa. Mas não acredito em um apagão de mão de obra. Temos uma visão esperançosa.
O edital de licitação da Transolímpica, via que ligará a Barra a Deodoro, deve ser divulgado na próxima semana. Segundo a prefeitura, serão investidos cerca de US$90 milhões na obra. Entre os principais planos na área de transporte estão ainda a construção da Linha 4 do metrô e corredores para ônibus.
Quanto à moradia, a Secretaria municipal de Habitação informa que vai investir na construção de residências para famílias de baixa renda em Jacarepaguá e Guaratiba.