Porto, o destino de quem aposta no futuro

29/10/2013 - O Globo, Fábio Vasconcellos, Flávio Tabak, Natanael Damasceno e Paulo Thiago de Mello

Patrick Fontaine conhece bem os efeitos da gentrificação. Ex-morador de Botafogo, saiu do bairro fugindo do aumento do preço dos aluguéis. Antes disso, durante uma temporada de estudos em Paris, viu como o fenômeno modificou em pouco tempo o bairro onde morou, ocupado originalmente por descendentes de imigrantes judeus e árabes.

Atento às mudanças, resolveu, ao menos uma vez, se beneficiar do processo e, há um ano, se instalou na Zona Portuária, que segundo estimativa da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Porto (Cdurp), deve receber R$ 8 bilhões em obras e serviços ao longo de 15 anos.

- Com a valorização do mercado imobiliário em Botafogo, não ia conseguir sobreviver ali. Como já tinha um grande interesse no Porto, cheguei ao Morro da Conceição - diz Patrick, que se estabeleceu em um apartamento num sobrado de três andares, construído na década de 50. -

Optei pelo que me parece lógico. Embora o mercado valorize mais os bairros da Zona Sul, como o Leblon, na minha opinião, aquela é a franja da cidade e não o seu centro.A poucos metros do apartamento de Fontaine, a Rua Camerino, esquecida durante muito tempo, apresenta sinais de que está sendo modificada pelo processo.

Assim como a primeira fase de obras do Porto Maravilha, em que se reformaram calçadas e mobiliário urbano de trechos da via, a presença de empresários como o carioca Ronnie Arosa é parte importante do processo. Ele deixou a Espanha, onde trabalhava como consultor de projetos de desenvolvimento, para ajudar o pai, Manolo Arosa, de 69 anos, na reconstrução de antigos motéis.

Eles têm benefícios fiscais do Comitê de Acomodações da prefeitura para os Jogos Olímpicos de 2016.- Percebemos o potencial dessa região, que tem poucos hotéis, apesar da procura. Na Espanha e Itália, por exemplo, centros de grandes cidades são cheios de opções de hospedagem. Aqui no Rio é o contrário - conta Arosa, que nota as mudanças na Camerino desde 2011.

- Vi surgirem um restaurante de comida asiática, lanchonete, salão de beleza e uma loja que emoldura quadros.Patrick Fontaine, por sua vez, se mostra preocupado com o destino dos moradores antigos, que compõem a identidade local. Em sua opinião, o poder público deveria investir em políticas inclusivas que garantissem o direito à moradia dos trabalhadores de baixa renda que já ocupavam a região antes do anúncio do projeto.

- Tem gente comprando imóveis, deixando fechado à espera da valorização. O poder público deveria garantir moradias de interesse social, evitando os efeitos negativos da gentrificação.O sociólogo Alberto Gomes, presidente da Cdurp, diz que já localizou 500 famílias em cortiços e imóveis abandonados. E que tem em seus planos a construção de 2.200 habitações de interesse social na região para absorver esses e outros moradores de baixa renda que desejarem continuar no local:

- Isso não evitará a saída de moradores antigos. As pessoas não moram onde querem, moram onde podem. O problema maior não é a questão da valorização do imóvel. A maior parte da população aqui é de proprietários. Mas, da mesma forma que o poder público não pode obrigar ninguém a sair de onde está, a não ser por motivos de segurança, também não pode obrigar a ficar. As pessoas vão fazer suas escolhas.Para ele, é preciso preservar a identidade do local.

Alberto diz que tem trabalhado na discussão de políticas fiscais, como desconto do IPTU, para quem permanecer nos morros da Conceição e Providência, e o aumento do ITBI para quem comprar.