Prefeitura não prioriza projetos habitacionais no Porto

24/10/2013 - Jornal do Brasil

Governo municipal privilegia complexos empresarias à construção de residências
 
O projeto inicial de revitalização da região portuária incluía, além das alterações em mobilidade urbana e na infraestrutura, a revitalização das moradias já existentes na região e a criação de novos complexos habitacionais, cujo resultado seria o repovoamento da região. Apesar do projeto, moradores afirmam que o local está sendo utilizado para a construção massiva de complexos empresariais, por seu caráter econômico mais vantajoso. Isso tornaria a região portuária uma extensão do Centro da cidade, com rotina movimentada e ativa apenas em horário comercial. A derrubada da Perimetral é o marco principal desse processo de suposta revitalização, mas não livra a região do seu futuro iminente: abandono e esvaziamento.

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O período noturno e os fins de semana deixariam a região portuária tão deserta quanto atualmente, se transformando em um reduto para casos de violência e a instalação de moradores de rua. Isso resultaria em um afastamento ainda mais intenso do resto da população, o que vai de encontro com o próprio conceito de revitalização. Além da melhoria de mobilidade questionável, o projeto agora revela a falta de compromisso do poder público com a população local, totalmente ignorada no projeto. O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (CREA-RJ), Agostinho Guerreiro, critica a postura da Prefeitura e não acredita em uma revitalização que desconsidera a construção de moradias.

"Não é o ideal porque quando se falou em revitalização, a ideia é revitalizar o porto e com isso, incluir a população. Qual o conceito de revitalização? É não ter uma cidade morta em nenhum momento do dia. E o que acontece com a cidade do Rio na parte da noite é que uma grande parte da cidade é morta, exatamente pela prioridade que foi se dando à parte de edificações institucionais, voltadas para serviços e comércio. São atividades que transcorrem fundamentalmente durante o dia", explica Agostinho.

O engenheiro ainda comenta sobre o modelo adotado em outras grandes cidades, que garantiram a união entre complexos comerciais e residenciais. "As grandes metrópoles do mundo, quando fizeram projeto de revitalização, trataram exatamente de mesclar áreas mortas, por esse tipo de situação, com habitação. Mesmo em áreas que já eram destinadas a instituições, eles incluíram edifícios habitacionais. E nos próprios edifícios institucionais foram mesclados andares voltados para o trabalho [comercial e de serviço], com residências. Isso proporciona um bairro com vida 24 h por dia. Com esse projeto, vamos ficar com a região do porto sem ser revitalizada e o Centro permanece esvaziado", alerta.

Agostinho ainda ressalta que o projeto inicial apresentado pela Prefeitura incluía a recuperação dos bairros antigos, como a Saúde e o Santo Cristo, revigorando suas partes residenciais já existentes, expandindo e mesclando com o setor de serviços. Também previa a criação de moradias de diversos padrões, envolvendo classes altas e baixas e que a mudança no projeto, priorizando edifícios não residenciais, significa "uma perda de oportunidade para a cidade".

Os moradores da região reclamam que o governo impôs um projeto de edificação na região portuária, sem incluir um debate com a população. Um critica, junto com os demais moradores, a postura da Prefeitura. "Não conversaram nada, não falaram nada com ninguém, simplesmente avisaram que vai ser prédio comercial e ponto. Está todo mundo reclamando, queremos chamar o Prefeito pra abordar a situação e ver se conseguimos conversar sobre o assunto", reprova.

A presidente da Associação dos Moradores do Morro da Conceição, Márcia Regina, afirma que nenhum tipo de investimento foi realizado na localidade e que a chegada de empreendimentos comerciais tem sido intensa. "Aqui no Morro da Conceição nada foi feito, a Prefeitura deixou muito a desejar aqui. Fizeram uma obra 'para gringo ver', abriram a rua toda porque iam fazer fiação subterrânea e a obra não foi finalizada. Tem uns postes aqui no meio da calçada, e as pessoas são obrigadas a andar no meio da rua. Tem dez dias que uma criança foi atropelada", reclama Márcia.

A moradora ainda reclama do processo de desapropriação realizado no local, que retirou alguns dos moradores antigos para criação de estabelecimentos de comércio. Segundo Márcia, nenhum dos moradores retirados recebeu qualquer tipo de indenização ou realocação. Denúncias como essa já haviam sido feitas por outros moradores. A ação do governo municipal, que desapropriou mais de cem mil pessoas, teria violado o direito à posse, feito propostas inadequadas de reassentamento e/ou de indenização, ignorado realização de aviso prévio adequado, e ainda feito intimidação e ameaças.