Trem, metrô e ônibus para as 2 mil famílias

25/06/2012 - Extra, Wilson Mendes

Conjunto habitacional Bairro Carioca, em Triagem, terá 112 prédios e vai receber pelo menos nove mil moradores, que contarão com uma diversificada oferta de transporte de massa na porta de casa

Quando a dona de casa Luiza Leda, hoje com 50 anos, foi removida de um terreno da Light invadido, na Favela de Manguinhos, ela e a família ganharam um teto novo. E só.
- Levaram a gente para o Nova Sepetiba. Não tinha asfalto nem ponto de ônibus perto. Poucos postes na rua tinham lâmpada. Isso foi há 12 anos e muito foi feito desde então. Mas, ainda hoje, a vida é difícil para quem precisa trabalhar fora daqui - revela a dona de casa.
Muitos vizinhos de Luiza, depois da primeira semana, nunca mais voltaram. Quem ficou se viu obrigado a sair de casa às 3h para chegar ao trabalho a tempo. Tudo por conta da rede precária de transporte de massa.
Mais de uma década se passou e, às vésperas da inauguração do novo conjunto habitacional Bairro Carioca, em Triagem, a história promete ser diferente.
Enquanto quem vive em Sepetiba demora hoje mais de duas horas para chegar ao Centro, os moradores de Triagem levarão 20 minutos. O conjunto, no entanto, vai exigir mais dos sistemas viários. Se todos forem usuários do metrô, o fluxo de pessoas duplicará na estação.
- Não há como pensar em habitação popular sem a oferta de transporte de massa. E não é tudo: é preciso ter escola, posto de saúde e lugar para a polícia, no mínimo - avalia o urbanista e historiador Nireu Cavalcanti.
A prefeitura garante que a nova geração de conjuntos habitacionais contará com todo esse aparato. O primeiro deles, o Bairro Carioca, será inaugurado no próximo sábado, conforme o EXTRA anunciou ontem, no primeiro dia da série "Quase uma cidade". Os 112 prédios abrigarão mais de duas mil famílias que perderam suas casas nas chuvas de abril de 2010 e moradores de áreas de risco dos morros Chupa-Cabra e do Turano.
- Temos ali a Linha 2 do metrô, ramais da SuperVia e uma série de linhas de ônibus. Estamos construindo também creche, escola, Clínica da Família e um complexo esportivo - enumera o secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar. - É um marco na política habitacional da cidade do Rio de Janeiro, um modelo para os novos conjuntos que estão sendo planejados.
Localização privilegiada é pré-requisito
A nova geração de conjuntos habitacionais da prefeitura será edificada em áreas semelhantes a de Triagem. A preocupação é que sejam locais de fácil acesso e, principalmente, servidos por transporte de alta capacidade, como trem, metrô e, agora, os Ligeirões, que já circulam pela Zona Oeste.
Estão previstos conjuntos em Costa Barros, Centro, Jacaré, Barros Filho e na região de Jacarepaguá.
- Sempre com localização privilegiada, com transporte na porta, além de outros equipamentos públicos. Em Triagem, temos até vista para o Cristo Redentor - garante o secretário Jorge Bittar.
O conceito aplicado na nova geração de habitação popular, no entanto, é antigo. Já foi tentado em outras oportunidades, algumas vezes com sucesso, outras, não.
- A proposta sempre foi essa. É claro que uma área com serviços comerciais e opções de transporte ajuda. Foi pensado assim no Pedregulho (em São Cristóvão). Mas quando olhamos para a Vila do João, que também está dentro da malha urbana, vemos que isso não é tudo e que a favelização pode ocorrer em prédios - exemplifica o urbanista Nireu Cavalcanti.
Além de uma rede de transportes de massa eficiente, seria preciso o acompanhamento de assistentes sociais e arquitetos, orientando os moradores.
- Se nos prédios da Zona Sul as pessoas fazem puxadinho, o que falar para uma família grande que mora em um conjunto? - finalizou.
Uma política centenária
A construção de conjuntos habitacionais no Rio completa, em 2012, 101 anos. Apesar do longo tempo, a política habitacional, descontinuada, vive de altos e baixos. Tudo o que o Bairro Carioca não quer é repetir os erros do passado. Os conjuntos de Sepetiba cometeram as mesmas falhas que haviam sido denunciadas na década de 60, na Cidade de Deus: a remoção de pessoas para áreas distantes sem infraestrutura básica e transporte.
Os moradores mais antigos ainda se lembram da caminhada de uma hora até o ponto de ônibus mais próximo e das ruas sem iluminação para as pessoas que saíam de madrugada para chegar a tempo ao trabalho.
Em Nova Sepetiba, muitos moradores chegaram no ano 2000, como a dona de casa Luiza Leda. Os problemas de 40 anos antes nunca foram tão atuais, como a carência de transporte que levou boa parte a optar entre a casa segura e o emprego.
E pensar que, há cem anos, o presidente Marechal Hermes instalou o primeiro conjunto habitacional, com 170 casas, às margens da estrada de ferro, no bairro que, hoje, leva seu nome.