Joias lapidadas

23/08/2012 - O Globo, Isabela Bastos

Igreja de São Francisco da Prainha, galpões da Gamboa e centro cultural são recuperados

A previsão de gastos do Porto Maravilha com obras e serviços nos próximos 15 anos é de R$ 8 bilhões. Mas, além de abrir novas ruas, avenidas e túneis, o projeto tem devolvido o viço a joias históricas na Zona Portuária. Por lei, o projeto é obrigado a destinar 3% de todos os recursos para a reforma de imóveis do patrimônio histórico e cultural. Na esteira da inauguração, em julho, do Jardim e do Cais do Valongo, serão entregues, até outubro, outros equipamentos públicos, como o Centro Cultural José Bonifácio, na Rua Pedro Ernesto, e os Galpões da Gamboa, nas imediações da Cidade do Samba. Também este ano será lançado o edital de licitação para reforma da Igreja de São Francisco da Prainha, na Sacadura Cabral.
Antigos depósitos, que faziam parte da ferrovia que ligava a Zona Portuária à Estrada de Ferro Dom Pedro II (atual Central do Brasil), os galpões da Gamboa deverão ser transformados num centro sociocultural. Segundo a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto (Cdurp), a ideia é que os galpões (duas áreas que somam cerca de 14 mil metros quadrados) tenham vários gestores externos. O pressuposto é que sejam ocupados por atividades que se sustentem, não necessitando com recursos municipais.
- É uma construção do século XIX, com tijolos no padrão inglês. Estamos tentando viabilizar o equipamento economicamente, para que ele possa ter autogestão - explica o assessor da presidência da Cdurp, Alberto Silva.
Ginásio foi inaugurado em 1877
Já o prédio do Centro Cultural José Bonifácio foi construído originalmente para abrigar uma das primeiras escolas públicas da cidade, atendendo a um pedido do imperador Dom Pedro II. O ginásio foi inaugurado em 1877 e extinto nos anos 1970. A construção em estilo renascentista permaneceu desocupada até 1977, quando lá foi instalada a Biblioteca Popular Municipal da Gamboa e, depois, a sede do Centro de Referência da Cultura Afro-brasileira.
No ano passado, o prédio foi interditado pela Defesa Civil, por apresentar riscos em sua estrutura. No local funcionavam instalações como a Galeria de Arte Heitor dos Prazeres, o Teatro Ruth de Souza e o espaço Cine Vídeo Grande Othelo. As obras de arte foram embaladas, e as atividades suspensas.
Após as obras, a intenção é que o centro cultural retome suas atividades, segundo informou a Secretaria municipal de Cultura. A programação, contudo, ainda está sendo definida.
- O autor do projeto dessa escola foi o arquiteto neoclássico Francisco Bittencourt da Silva, que, entre outras obras, projetou o Centro Cultural Banco do Brasil; o prédio da Escola Amaro Cavalcanti, no Largo do Machado; e o primeiro planejamento de bairro moderno, em 1874, para Vila Isabel. Ele também fundou o Liceu de Artes e Ofícios - lembra o arquiteto e historiador Nireu Cavalcanti.
No caso da Igreja de São Francisco da Prainha, uma das mais antigas do Rio, o edital de reforma será publicado, segundo a Cdurp, após aprovação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), uma vez que a construção é tombada. Hoje o prédio sofre com o desgaste do tempo. Parte do reboco da fachada está despencando, e do telhado brotam arbustos que ajudam a deteriorar o conjunto. A reforma foi noticiada pela coluna Gente Boa, do GLOBO.
A capela foi erguida em 1696, pelo padre Francisco da Motta. Muito rico, o pároco morreu em 1704, mas, antes, doou suas posses para a Ordem Terceira de São Francisco da Penitência. A família de Francisco Motta tinha um trapiche (espécie de depósito de mercadorias) perto da capela. A capela e o trapiche acabaram destruídos durante a invasão francesa ao Rio, em 1711. A reconstrução aconteceu a partir de 1738, quando a igreja ganhou o estilo barroco que tem hoje. No altar-mor está a imagem de Bom Jesus dos Navegantes.
- O mar chegava ao pé da escada da igreja nessa época. As esquadras francesas queimaram tudo, na tentativa de ocupar um pequeno forte que havia no Morro da Conceição - conta Nireu.