Produção agrícola ocupa área 9 vezes maior do que a da Tijuca

04/11/2012 - O Globo

Agricultura garante renda mensal a 40 famílias e movimenta R$ 120 milhões/ano na capital

Trem como vizinho. O cultivo de couve e bertalha, numa horta da Zona Norte, tem como barreira uma a estação de trens urbanos Pedro Kirilos / O Globo

RIO O paraibano Antônio Sebastião do Carmo, de 47 anos, rega quatro vezes por dia seus pés de couve, alface, rúcula e bertalha. A água sai com força do grande chuveiro improvisado na ponta de uma mangueira e ajuda a aliviar o calor da primavera. O tabuleiro verde de Antônio junta-se à fatia de Geraldo Moreira, que se conecta à horta de Francisco José dos Santos, ambos do Rio Grande do Norte. A única divisão por ali é para separar as culturas da linha férrea. De Rocha Miranda a Barros Filho, a agricultura garante renda mensal a 40 famílias. Microcosmo de um universo que movimenta R$ 120 milhões por ano na capital, segundo a Secretaria estadual de Agricultura, o município do Rio reúne 9,4 mil hectares de agropecuária 7,6% do território. São 9 vezes a área do bairro da Tijuca ou 10 mil campos de futebol oficiais.

Uma área tão extensa coleciona histórias de resistências. Em meio a uma região de expansão do concreto, Valdecir Goulart, de 68 anos, cultiva aipim. Com braços queimados pela química que sempre aplicou nas roças, prefere não revelar quanto ganha por mês com o plantio num trecho de 60 hectares em Santa Cruz isso varia muito, mas dá para levar a vida e observa que sua atividade não resistirá muito tempo.

Nesta baixada de Santa Cruz só dá mesmo aipim e quiabo. Mas há 20 anos a produção caiu 50%. As casas estão acabando com tudo diz o agricultor.

Plano Diretor dificulta crédito

Francisco Santos, que cuida de hortaliças ao lado da estação de trem de Honório Gurgel, também se preocupa com o futuro. O dono da lavoura vende os produtos numa feira e paga dois salários-mínimos a Francisco. Perto dali, Geraldo Moreira vive com a mulher, Joana, numa casa simples em frente às plantações das quais consegue sorver R$ 2 mil por mês.

Debaixo de torres de alta tensão, as hortas que acompanham a linha férrea estão em terrenos que pertencem à Light. A área do Parque de Madureira também era ocupada por hortas e casas. As 580 famílias da antiga Vila das Torres foram indenizadas e saíram do local. O projeto da prefeitura de expandir a urbanização a Turiaçu, Rocha Miranda e Honório Gurgel deixa o cultivo de hortaliças com os dias contados.

Mas se o valor da produção agrícola do Estado do Rio não ultrapassa a faixa dos R$ 1,5 bilhão por ano representa apenas 0,5% da produção brasileira, segundo o IBGE , a cidade oferece boas oportunidades no ramo da floricultura e da produção de plantas ornamentais. É um setor que tem crescido com vigor nos últimos anos em Guaratiba, Vargem Grande, Vargem Pequena e Campo Grande. Segundo a Secretaria estadual de Agricultura, em 2007 havia 150 registros de agricultores atuando nesse nicho na cidade. Hoje em dia já são 230.

Se as culturas de aipim e quiabo da região de Santa Cruz têm sofrido uma retração nos últimos anos, muito em função da chegada de empreendimentos como a CSA, por outro lado temos forte avanço da floricultura avalia o secretário de Agricultura, Alberto Mofati.

Há 20 anos no setor, Moyses Abtibol deixou o ramo imobiliário para comandar o Horto das Palmeiras, na Ilha de Guaratiba. Com 40 hectares, o sítio é o maior fornecedor nacional de plantas para paisagismo. Moyses surfa numa onda de pujança, mas não deixa de criticar a falta de incentivos ao produtor:

Há quatro anos fiz um projeto com o Sebrae para captar crédito agrícola junto ao Banco do Brasil. Não consegui. Existe um esforço dos produtores, mas não há apoio financeiro.

Uma das explicações para a falta de apoio está no artigo 13 do Plano Diretor, que caracteriza o território do Rio como integralmente urbano. Assim, créditos para agricultura ficam travados. Em 2005, a prefeitura aprovou um Plano de Desenvolvimento Rural, mas o projeto ficou na gaveta. Coordenador do programa Hortas Cariocas, Julio Cesar Barros pondera:

De fato, faltam programas de apoio à produção, mas temos conseguido algumas isenções.



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